Pesquisar

Loading

31 de dezembro de 2011

Os mesmos erros

"Então partiram do monte Hor, pelo caminho do Mar Vermelho, a rodear a terra de Edom; porém a alma do povo angustiou-se naquele caminho. E o povo falou contra Deus e contra Moisés: Por que nos fizestes subir do Egito para que morrêssemos neste deserto? Pois aqui nem pão nem água há; e a nossa alma tem fastio deste pão tão vil. Então o SENHOR mandou entre o povo serpentes ardentes, que picaram o povo; e morreu muita gente em Israel. Por isso o povo veio a Moisés, e disse: Havemos pecado porquanto temos falado contra o SENHOR e contra ti; ora ao SENHOR que tire de nós estas serpentes. Então Moisés orou pelo povo. E disse o SENHOR a Moisés: Faze-te uma serpente ardente, e põe-na sobre uma haste; e será que viverá todo o que, tendo sido picado, olhar para ela. E Moisés fez uma serpente de metal, e pô-la sobre uma haste; e sucedia que, picando alguma serpente a alguém, quando esse olhava para a serpente de metal, vivia" (Números 21:4-9)

Aqui, o povo hebreu, o povo de Deus, estava já há muitos anos caminhando pelo deserto, já há quase quarenta anos caminhavam pelo deserto. E este povo escolhido por Deus, era um povo que não se firmava nas promessas de Deus. Eles estavam já há tanto tempo no deserto, justamente por serem rebeldes ao SENHOR, mas esta lição parecia ser dura de aprender (Nm 14:22-23; 29-34).

Mas a rebeldia de Israel tem muito a nos ensinar:

v4 - "Então partiram do monte Hor, pelo caminho do Mar Vermelho, a rodear a terra de Edom; porém a alma do povo angustiou-se naquele caminho"

O texto diz que o povo teve que contornar a terra de Edom e que, por conta disso, “a alma do povo angustiou-se”.

Moisés havia pedido permissão ao rei de Edom para passar por suas terras e, assim, chegar à terra de Canaã, mas isso não lhes foi permitido. Edom era uma terra onde certamente não lhes faltaria água, nem alimento, mas ainda que tivessem prometido pagar por tudo o que fosse consumido por eles e por seus animais, não receberam permissão (Nm 20:14-20). Foi preciso contornar as terras por um caminho que, pelo que podemos entender, foi pesaroso e escasso de água.

Há momentos em que ficamos angustiados porque parece que nossos sonhos ficam mais distantes; há momentos que o descanso parece fugir de nós; às vezes parece que nossas conquistas escapam por entre nossos dedos: “Ah! Logo agora que parecia tão perto!”. E num momento tudo parece perdido. O povo estava próximo da ‘terra prometida’, mas precisou dar uma volta para alcança-la e o caminho mais fácil ficou para trás. E fico pensando uma coisa quando leio este texto: O povo de Israel era guiado e dirigido por Deus. De dia uma coluna de nuvem e de noite uma coluna de fogo orientava todo o povo. Deus era quem determinava quando partir e quando acampar (Nm 9:8-23). Mas Moisés pediu permissão para passar pela terra de Edom e não a conseguindo, teve que contornar a região. Ora, se era Deus quem conduzia o povo, logo foi por permissão de Deus que eles contornassem Edom! Se a coluna que ia adiante deles os guiasse os conduzisse para dentro das terras de Edom, não teria o povo seguido, com ou sem a permissão do rei de Edom? Com certeza! Mas ainda assim, Deus em sua soberania não interferiu no livre-arbítrio do rei de Edom e conduziu Israel pelos contornos de suas terras. Aquele caminho pesaroso e de escassez de água foi o caminho por onde Deus conduziu o seu povo. Deus estava com eles!

Muitas vezes nos esquecemos disso! Em momentos de aflições, de desilusões, em momentos em que nossas realizações parecem distantes de nós, em momentos de dificuldades e escassez, Deus também está conosco! Ele não nos abandona. O Senhor, em Sua Palavra, nunca nos prometeu um caminho fácil, muito pelo contrário: “O caminho é apertado e a porta é estreita” (Mt 7:14) - o caminho é apertado, não há conforto; “Ide. Eis que vos mando como cordeiros no meio de lobos” (Lc 10:3) – o que acontece com cordeiros no meio de lobos? – “Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si mesmo tome a sua cruz e siga-me” (Mc 8:34) – o que isso quer dizer? Será que seus discípulos entenderam o que o Senhor Jesus quis dizer com isso? Certamente! A cruz era um instrumento de martírio. Era a pior pena que um condenado poderia sofrer. Todo condenado à morte por crucificação era obrigado a carregar a sua cruz até o local de seu martírio. Era isso que o Senhor dizia aos seus discípulos: ‘Querem me seguir? Então venham, peguem sua cruz e sigam-me! De agora em diante vocês estão mortos para este mundo; já estão condenados por ele. De agora em diante vocês morreram para esta vida, para os seus desejos e paixões, morreram para o seu próprio eu’. Será que é fácil viver uma vida de renúncia? Será que é fácil viver uma vida de entrega total a Cristo e ao próximo? Sabemos que não. Jesus nos disse ainda: “No mundo tereis aflições” (Jo 16:33) – enquanto estivermos neste mundo seremos afligidos, angustiados, padeceremos dores. O Senhor nunca nos prometeu um caminho fácil, mas nos prometeu que sempre estaria conosco! “Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos” (Mt 28:20) – a caminhada não é fácil, mas Ele está conosco! Problemas vêm, mas Ele está conosco! Seremos angustiados, mas Ele está conosco! Vamos ser derrubados algumas vezes, mas Ele está conosco! Vamos ser injustiçados muitas vezes, mas Ele está conosco! E em momentos de injustiça, tomem muito cuidado para não disfarçarem um pedido irado de vingança por trás de uma suposta oração de glorificação a Deus. Porque é muito fácil mascararmos nosso ódio debaixo de uma falsa adoração: “Senhor, me exalta neste lugar para que estes que me humilharam sejam envergonhados!”; “Ó Senhor, pese suas mãos sobre estes que me afrontam, para que teu nome seja glorificado neste lugar!” - Isso é na verdade, um clamor por vingança. Mas deixe toda vingança nas mãos do Senhor que é perfeitamente Justo para retribuir a cada um conforme aquilo que fizerem. Vamos preferir seguir o exemplo de Cristo: “Pai perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (Lc 23:34) – não é o mais fácil, mas é o mais correto e também nisto Deus está conosco!

E o povo de Israel passou neste momento, conforme lemos, por uma desventura, por uma dificuldade. E diante de problemas o povo de Deus, ou clama ao Senhor e descansa em sua providência, ou murmura, demonstrando pouca confiança nas Suas promessas. Israel escolheu murmurar:

v5 – “E o povo falou contra Deus e contra Moisés: Por que nos fizestes subir do Egito para que morrêssemos neste deserto? Pois aqui nem pão nem água há; e a nossa alma tem fastio deste pão tão vil”

Mas que povinho ingrato! Que povo perverso! Mas que gentinha pequena e medíocre! Percebam o quão baixo foi o caráter deste povo por conta desta murmuração: este povo era escravo no Egito e Deus liberta toda esta gente da opressão de Faraó. Liberta com grandes sinais e prodígios. Deus opera milagres incríveis diante de todos, demonstrando o seu poder e juízo; demonstrando que Ele é o Único e Verdadeiro Deus. E agora este povo caminhava livre pelo deserto rumo a uma terra muito boa, terra que manava leite e mel, terra esta prometida por este mesmo Deus Poderoso e Verdadeiro que os livrara das mãos de Faraó. E agora diante de uma dificuldade o que o povo diz:

"Ah, porque saímos do Egito?” – Perceberam? Para este povo era melhor permanecer escravo e ser duramente oprimido, se isso lhe garantisse pelo menos boa comida, do que ser livre e padecer, por algum tempo, de alguma necessidade até que alcançasse a terra prometida, a terra melhor, o lugar de fartura, terra que manava leite e mel. Para eles era melhor serem escravos, se isso lhes desse algum tipo de conforto, do que serem livres e terem que depender totalmente de Deus numa terra árida e sem recursos, por algum tempo, até que alcançassem a terra da promessa. Para eles era melhor o salário da escravidão do que o sustento de Deus!

“Ah, está terra é seca, não há água neste lugar!” – não fazia muito tempo, Deus, por meio de Moisés, fez fluir água da rocha para saciar a sede não só do povo como também de todos os seus animais. Ora, esse Deus Poderoso e Benigno que já os vinha sustentando há tanto tempo não continuaria a Sua obra até cumprir a Sua promessa? Mas este povo não se firmava nas promessas de Deus, nem se lembravam do Seu cuidado e sustento.

“Ah, já estamos enfastiados deste pão, já enjoamos deste pão tão vil” – o povo passou a desprezar o maná de Deus. Deus enviava todas as manhãs o maná sobre o deserto. Era maravilhoso este milagre de Deus na vida do povo de Israel. Segundo a Palavra de Deus o maná era como a semente de coentro que quando comido ao natural seu sabor era como o de bolos de mel (Êx 16:31), já quando moído ou amassado e preparado ele tinha o gosto de azeite fresco (Nm 11:7-8). E mesmo diante de todo este cuidado de Deus, o povo murmura!

Mas vamos tirar os olhos de Israel um pouco e vamos olhar para nós mesmos, vamos olhar para nossas atitudes. Porque muitas vezes lemos a história de Israel e pensamos assim: “Ah, se eu tivesse visto estas maravilhas jamais agiria como este povo rebelde!”. Será? Porque a história do êxodo de Israel ilustra a nossa própria história, nós podemos dizer que a história de Israel é um espelho da nossa própria história: A vida de escravidão no Egito pode ser entendida como a nossa vida de escravidão no pecado; viver no Egito é viver no mundo longe da vontade de Deus, longe da comunhão com Deus, debaixo da opressão do inimigo. A Páscoa que o povo de Israel celebrou na noite em que Deus libertou a nação, simboliza a morte de Cristo cujo sangue livra da morte e da escravidão do pecado todo aquele que nele crê. A peregrinação de Israel pelo deserto simboliza a nossa própria peregrinação, porque seguimos como forasteiros neste mundo (1Pe 2:11), pois nossa pátria não é daqui, nossa terra prometida é a Jerusalém Celestial (Hb 11:13-16,12:22; Ap 21:1-3). Até que alcancemos a promessa de Deus, peregrinaremos neste deserto que é o mundo. Então percebam que nós também somos, muitas vezes, mesquinhos como foi o povo de Israel. O Senhor nos tirou da escravidão do pecado, nos tirou do reino das trevas e nos transportou para o reino do Filho do seu amor (Cl 1:13), nos prometeu a Vida Eterna na Nova Jerusalém, uma vida plena de comunhão com Ele, mas até que a plenitude dos tempos se cumpra, por um pouco, seremos contristados, até que a glória de Deus se manifeste em nós (1Pe 1:3-7). Mas mesmo diante de tamanha promessa, mesmo diante de toda a providência de Deus em nossas vidas, nós muitas vezes, preferimos buscar prazer e conforto na escravidão da velha vida de pecados. A Palavra nos diz que “se alguém está em Cristo, nova criatura é; as coisas velhas já passaram; eis que tudo se fez novo” (2Co 5:17) e que o verdadeiro valor em Cristo é o “ser nova criatura” (Gl 6:15), mas nós muitas vezes desprezamos a vida de nova criatura para vivermos a velha vida sem qualquer compromisso com o Pai; longe de Sua vontade, ou da Sua comunhão. Olhe para a sua própria vida e analise quantas vezes você tem deixado Deus de lado e feito aquilo que não é de Sua vontade. Quantas vezes temos buscado a nossa própria satisfação, ainda que esta seja contrária à vontade de Deus? Quando leio a história de Israel eu me vejo muitas vezes agindo como eles e só encontro uma explicação para eu estar aqui hoje: a imensa graça e misericórdia de Deus agindo na minha vida. E a história de Israel também nos dá um alerta: O Deus de amor também traz juízo, mas Ele sempre nos dá uma oportunidade de nos arrependermos.

v6 – “Então o SENHOR mandou entre o povo serpentes ardentes, que picaram o povo; e morreu muita gente em Israel”

Diante da ingratidão do povo de Israel e mais, diante da falta de confiança do povo nas promessas do SENHOR, Deus envia serpentes no meio da congregação. A falta de fé no SENHOR trouxe ao povo uma dificuldade ainda maior. Se já estava difícil para o povo enfrentar o deserto, agora então, tornou-se insuportável. E qual lição tiramos disto? Que no deserto – lugar de provação; de purificação; de tratamento de Deus; lugar onde, muitas vezes, nos sentimos sós e desamparados – a fé em Deus é o que torna nossa caminhada menos conturbada; é esta fé em Deus que nos trará aperfeiçoamento e maturidade espiritual. Estar no deserto e não buscar o apoio de Deus é atrair para si as serpentes que mais, cedo ou mais tarde, vão dar uma mordida fatal. Mas qual é a função da tribulação na vida do crente? Será que há algum motivo para as tribulações, as dificuldades ou aflições na vida dos cristãos? O versículo seguinte nos mostra que sim:

v7 – “Por isso o povo veio a Moisés, e disse: Havemos pecado porquanto temos falado contra o SENHOR e contra ti; ora ao SENHOR que tire de nós estas serpentes. Então Moisés orou pelo povo”

Eis aqui o princípio de toda repreensão que vem da parte de Deus: o seu objetivo principal é levar o pecador ao arrependimento verdadeiro. Toda repreensão, ou correção que vem da parte de Deus tem por fim o arrependimento do pecador para que este volte aos caminhos do SENHOR. É esta a verdade que lemos na Palavra de Deus: “Porque o SENHOR repreende aquele a quem ama, assim como o pai ao filho a quem quer bem” (Pv 3:12). E o Senhor Jesus também disse: “Olhai por vós mesmos. E, se teu irmão pecar contra ti, repreende-o e, se ele se arrepender, perdoa-lhe” (Lc 17:3) – porque a repreensão não deve ser usada como uma forma de subjugar os outros, mas de entrar em comunhão pelo amor de Cristo, reinando a Paz. Onde há perdão, não há mais lembrança da falha. Aqui, o povo de Israel estava sendo disciplinado pelo SENHOR e Seu objetivo era levar a nação ao arrependimento. E o povo entendeu – ‘Estamos pecando. Estamos murmurando contra o SENHOR!’. Entendendo o seu erro, o povo clama a Moisés que interceda por eles. Tomaram a atitude correta. Moisés era a boca de Deus no meio do povo. Mas o mais interessante desta história toda foi a providência divina para o clamor daquele povo:

v8 – “E disse o SENHOR a Moisés: Faze-te uma serpente ardente, e põe-na sobre uma haste; e será que viverá todo o que, tendo sido picado, olhar para ela”

Mas qual foi o pedido do povo? “ora ao SENHOR que tire de nós estas serpentes. Mas notem que Deus proveu ao povo uma forma de enfrentarem aquela adversidade. Deus não retirou as serpentes do meio da congregação; Deus não retirou a tribulação do meio do povo, mas deu a todos um escape para suportarem a tribulação. Na grande maioria das vezes (para não dizer todas), nós clamamos ao Pai pedindo a Ele que Ele retire de nós toda a tribulação, assim como os israelitas fizeram; pedimos a Ele que nossos problemas desapareçam – até porque entendemos errada a oração que o Senhor nos ensinou: “Não nos deixe cair em tentação” (Mt 6:13) - Este versículo pode ser melhor entendido da seguinte forma: ‘Senhor, na tentação não me deixe cair’; ‘enquanto eu estiver em tentação me deixe de pé, Senhor!’. Aqui o Senhor nos ensina a clamar ao Pai para que Ele nos livre das tentações às quais não podemos suportar: ‘Senhor, não me conduza àquelas situações para as quais eu ainda não estou preparado para suportar’. Mas se você está maduro, aguarde provações e fique tranquilo porque: “... Deus é fiel; ele não permitirá que vocês sejam tentados além do que podem suportar. Mas, quando forem tentados, ele lhes providenciará um escape, para que o possam suportar” (1 Co 10:13) - o melhor é pedirmos ao Pai sabedoria e força para superarmos toda tribulação.

As serpentes estavam por toda parte, o povo estava arrependido e amedrontado e buscou em Deus uma solução. A solução de Deus para o povo foi: ‘Vamos exercitar a fé deste povo’ – não foi o que Deus disse, mas eu entendo que foi esta a intenção dEle. Quando Deus mandou que Moisés fizesse uma serpente de metal fixada numa haste e que a pusesse num lugar visível a todo o povo, Deus não concedeu nenhum poder especial àquela serpente de metal, mas direcionou a nação a crer em sua promessa: ”e será que viverá todo o que, tendo sido picado, olhar para ela”. É de vital importância entender que o que livrava da morte não era a imagem da serpente, mas sim a fé daquele que a olhava e cria na promessa do SENHOR. E como é que podemos ter certeza disto? Examinando as Escrituras! Se nos reportarmos ao Livro de Tiago encontraremos uma passagem interessante a respeito da cura divina: “Está alguém entre vós doente? Chame os presbíteros da igreja, e orem sobre ele, ungindo-o com azeite em nome do Senhor; e a oração da fé salvará o doente, e o Senhor o levantará; e, se houver cometido pecados, ser-lhe-ão perdoados” (Tiago 5:14-15) – aqui vemos a orientação de Tiago para que os presbíteros (bispos e pastores – não é qualquer um) orassem e ungissem os enfermos, para que fossem curados. Notemos que o Senhor levantará o doente segundo a oração da fé! Não é a unção com o óleo o mais importante, mas sim a oração da fé na promessa de que o Senhor levantará o doente. É na fé que está o real valor. O mais relevante sobre esta questão, entretanto, é a comparação que o Senhor Jesus fez: “E, como Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do homem seja levantado; Para que todo aquele que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3:14-15). O Senhor Jesus apresentou este evento da vida do povo de Israel como uma figura do que viria a acontecer consigo mesmo. A serpente de metal levantada no deserto, conforme as palavras do próprio Senhor Jesus, é um tipo de Cristo no Antigo Testamento. Ora, se são salvos pela Graça de Deus todos os que creem em Cristo e não, simplesmente, os que olharam para Ele, assim também foram salvos mediante fé, todos os que, olhando para serpente, creram na promessa do SENHOR. A serpente de metal de forma figurada representa o Senhor Jesus, pois foi levantada, assim como o Senhor Jesus também; foi uma providência de Deus para livrar as pessoas da morte física, assim como nosso Senhor foi a providência divina para livrar as pessoas da morte espiritual e, na consumação dos séculos, também da morte física para sempre; a serpente de metal foi um livramento em meio a adversidade (não da adversidade), assim como o Senhor Jesus é o nosso Salvador que nos salva já neste mundo, para por fim, nos salvar também deste mundo; a serpente de metal foi uma bênção de Deus para o povo de Israel, assim como nosso Senhor Jesus é a maior bênção que o Pai ofereceu a todos os povos e nações da terra.

v9 – “E Moisés fez uma serpente de metal, e pô-la sobre uma haste; e sucedia que, picando alguma serpente a alguém, quando esse olhava para a serpente de metal, vivia”

Segundo a palavra de Deus, Moisés fez a serpente, e conforme Sua própria palavra, Deus cumpriu a Sua promessa: todo aquele que, picado por alguma serpente, olhava para a serpente de metal, permanecia vivo. Mas uma vez é bom frisarmos: Deus não livrou o povo das serpentes, nem mesmo de suas picadas, mas permaneceu fiel as Suas promessas e preservou a vida de todo aquele que creu.

Nesta vida encontraremos com muitas serpentes pelo caminho. Algumas virão em desertos, outras virão em mananciais e nos pegarão de surpresa, algumas talvez consigam nos picar; pode ser até que nos deparemos com aquela Antiga Serpente, mas não se assustem, sigam o conselho do homem de Deus: “Sujeitai-vos, pois, a Deus, resisti ao diabo, e ele fugirá de vós” (Tg 4:7) – mantenha-se sujeito a Deus, debaixo da Sua autoridade que assim você resiste, até que ele fuja e não se esqueça, o Senhor já nos revelou acerca desta Antiga Serpente: em breve “o Deus de paz esmagará Satanás debaixo dos vossos pés” (Rm 16:20). Apenas sigam o conselho do nosso Senhor “tende bom ânimo, eu venci o mundo” (Jo 16:33) – o Senhor está nos dizendo: tende bom ânimo, não desanime durante sua caminhada; persevere em sua fé. Não deixe seu fôlego acabar, o mundo pode ser terrível, mas Eu venci o mundo; toma fôlego de mim, se encha do meu sopro, se encha do meu Espírito (Ef 5:18) e te conduzirei em segurança mesmo que em meio a desertos.

Deus tem sempre o melhor para nos oferecer, mas muitas vezes nós não reconhecemos. E ter a Deus como nosso Senhor é a maior bênção que poderíamos almejar – “Bem-aventurado é o povo cujo Deus é o SENHOR” (Sl 144:15) – mas nós ficamos buscando bênçãos menores e nem nos propomos a, pelo menos, buscar em Deus sabedoria para usufruir das bênçãos menores que Deus graciosamente nos dá. Nós temos uma irritante habilidade para transformar as bênçãos de Deus em maldições nas nossas vidas. 

Quantas histórias nós conhecemos de pessoas que receberam uma provisão de Deus, um bom emprego, mas que com o tempo, deixaram-se dominar pelo seu emprego, pelas suas obrigações, a ponto de não mais poderem congregar e até de perderem a vontade de congregar? É um exemplo de bênção da parte de Deus que transformamos em maldição. Mas alguns podem me questionar e dizer que isto, na verdade, não é uma bênção de Deus, mas um laço do inimigo para desviar o crente do caminho. Então eu já complemento, perguntando: Quando Deus enviou codornizes para o povo no deserto comer, isso foi uma bênção da parte de Deus ou uma maldição? Vamos analisar: O povo de Israel, como de costume, murmurou contra Deus:

Ex 16:3 –“Quem dera tivéssemos morrido por mão do SENHOR na terra do Egito, quando estávamos sentados junto às panelas de carne, quando comíamos pão até fartar! Porque nos tendes trazido a este deserto, para matardes de fome a toda esta multidão”.

Em resposta, o SENHOR, em Sua misericórdia responde:

Ex 16:12-14 – “Tenho ouvido as murmurações dos filhos de Israel. Fala-lhes, dizendo: Entre as duas tardes comereis carne, e pela manhã vos fartareis de pão; e sabereis que eu sou o SENHOR vosso Deus. E aconteceu que à tarde subiram codornizes, e cobriram o arraial; e pela manhã jazia o orvalho ao redor do arraial. E quando o orvalho se levantou, eis que sobre a face do deserto estava uma coisa miúda, redonda, miúda como a geada sobre a terra” [o maná].

Mesmo diante de tamanha ingratidão de Israel, o SENHOR abençoou aquele povo com carne e pão. Mas esta bênção que veio da parte de Deus, como prova de que JEOVÁ é o único Deus Verdadeiro, tornou-se em maldição por causa da dureza e ingratidão de coração deste povo. Vejam: numa outra ocasião o povo de Israel, mais uma vez, murmura contra o SENHOR:

Nm 11:4 – “E o vulgo, que estava no meio deles, veio a ter grande desejo; pelo que os filhos de Israel tornaram a chorar, e disseram: Quem nos dará carne a comer?” – Nm 11:6 – “Mas agora a nossa alma se seca; coisa nenhuma há senão este maná diante dos nossos olhos”.

E a respostado SENHOR foi:

Nm 11:18 – “E dirás ao povo: Santificai-vos para amanhã, e comereis carne; porquanto chorastes aos ouvidos do SENHOR, dizendo: Quem nos dará carne a comer? Pois íamos bem no Egito; por isso o SENHOR vos dará carne, e comereis” – Nm 11:31-32 – “Então soprou um vento do SENHOR e trouxe codornizes do mar, e as espalhou pelo arraial quase caminho de um dia, de um lado e de outro lado, ao redor do arraial; quase dois côvados sobre a terra. Então o povo se levantou todo aquele dia e toda aquela noite, e todo o dia seguinte, e colheram as codornizes; o que menos tinha, colhera dez ômeres; e as estenderam para si ao redor do arraial – esta foi a bênção.

Mas seguindo o texto, lemos:

Nm 11:33-34 – “Quando a carne estava entre os seus dentes, antes que fosse mastigada, se acendeu a ira do SENHOR contra o povo, e feriu o SENHOR o povo com uma praga mui grande. Por isso o nome daquele lugar se chamou Quibrote-Ataavá, porquanto ali enterraram o povo que teve o desejo” – o que era uma bênção da parte de Deus, Israel tornou em maldição porque desejou as delícias do Egito, desprezando as dádivas de Deus.

Outro exemplo claro é a própria serpente de metal. A serpente de metal foi uma bênção de Deus para povo. Foi o sinal do livramento de Deus entre o povo de Israel. Mas o que aconteceu com esta serpente? A serpente que deveria ser um símbolo da fidelidade de Deus, um memorial do cumprimento da promessa de Deus, pelo menos enquanto as víboras estavam entre o povo, tornou-se uma grande pedra de tropeço no meio da nação de Israel. Em 2 Reis 18 encontramos a história do rei Ezequias e no versículo 4 temos a seguinte descrição de seus atos:

“Ele tirou os altos, quebrou as estátuas, deitou abaixo os bosques, e fez em pedaços a serpente de metal que Moisés fizera; porquanto até àquele dia os filhos de Israel lhe queimavam incenso, e lhe chamaram Neustã” 

Aquilo que era uma bênção da parte de Deus, tornou-se uma maldição, não pelo SENHOR, mas pela imaturidade do povo de Israel que insistia em se rebelar contra Deus, fazendo de meros símbulos uma fonte de idolatria. É por isso que eu não gosto do uso de objetos para “ajudar a fé”: rosa ungida, sabonete ungido, roupas ungidas, lenços, fitinhas, canetas, contratos ungidos; até porque, no novo testamento, o único alvo de unção com óleo são os enfermos. Não vemos no novo testamento unção de objetos, só unção de enfermos (Tg 5:14). Esses tipos de coisa, em minha opinião, só nos fazem mudar o foco da verdadeira devoção. Ao invés de depositarem a fé no Deus que sara, que é provedor, que é a nossa Paz, passam a depositar a fé na correntinha ungida, na água ungida, no sal, na fogueira... Foi o que aconteceu com o povo de Israel, ao invés de firmarem sua fé no Deus da providência, fizeram da providência de Deus o seu próprio deus. O perigo é que de repente, para uma porção de gente, o que cura é a rosa e não Deus; o que livra é óleo lambuzado no carro e não Deus; o que liberta do pecado é a fogueira santa e não o sangue de Cristo.

Israel deixou a adoração do Deus Verdadeiro de lado para adorar a serpente de metal. E a conclusão que tiramos de tudo o que foi dito é: busquemos sempre o Deus de todas as bênçãos e não todas as bênçãos de Deus. Ainda que não conquistemos tudo o que queremos, vamos agrader a Deus por tudo o que já conquistamos. E ainda que a vida nos reserve derrotas, saibamos que a maior de todas as derrotas é viver a vida e morrer sem Deus.

29 de setembro de 2011

Ele vos batizará com Espírito Santo e com fogo! Que fogo é este?


“E eu, em verdade, vos batizo com água, para o arrependimento; mas aquele que vem após mim é mais poderoso do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ele vos batizará com o Espírito Santo, e com fogo” (Mateus 3:11)


O Senhor batiza com o Espírito Santo e com fogo. Que ‘fogo’ é este?

Segundo a hermenêutica bíblica (prática da interpretação das Escrituras Sagradas) há fatores importantes que devem ser levados em conta quando analisamos o texto sagrado. Conhecer o ‘autor’, o ‘porque escreveu’ e o ‘para quem escreveu’, são ferramentas valiosíssimas para uma boa compreensão do texto. No intuito de se preservar a ortodoxia dos ensinamentos bíblicos, desenvolveu-se na hermenêutica bíblica, uma série de regras para “nortear” o estudo da interpretação. Vamos analisar, então, o texto de Mt 3:11 segundo as três principais leis da hermenêutica sacra: A Lei do contexto, a Lei dos textos paralelos e a Lei do autor.

1. Lei do contexto – O contexto é o "lugar" onde o versículo em questão está inserido; qual o tema ou assunto que está sendo abordado nos versículos anteriores e posteriores ao texto em estudo (é o que costuma-se chamar de contexto imediato). Algumas vezes, para um melhor entendimento do contexto é necessário analisar todo o capítulo, ou todo o livro em que o versículo está inserido. Outras vezes a Bíblia como um todo é o contexto que deve ser levado em consideração. Costuma-se dizer que “um versículo deve concordar com toda a Bíblia e toda a Bíblia deve concordar com um versículo”.

Vamos analisar o contexto de Mt 3:11

v.1 - E, naqueles dias, apareceu João o Batista pregando no deserto da Judéia,
v.2 - E dizendo: Arrependei-vos, porque é chegado o reino dos céus.
v.5 - Então ia ter com ele Jerusalém, e toda a Judéia, e toda a província adjacente ao Jordão;
v.6 - E eram por ele batizados no rio Jordão, confessando os seus pecados.
v.7 - E, vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo, dizia-lhes: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura?
v.8 - Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento;
v.10 - E também agora está posto o machado à raiz das árvores; toda a árvore, pois, que não produz bom fruto, é cortada e lançada no fogo.
v.11 - E eu, em verdade, vos batizo com água, para o arrependimento; mas aquele que vem após mim é mais poderoso do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ele vos batizará com o Espírito Santo, e com fogo.
v.12 - Em sua mão tem a pá, e limpará a sua eira, e recolherá no celeiro o seu trigo, e queimará a palha com fogo que nunca se apagará.

Vemos por estes textos que João Batista surgiu no deserto, pregando o arrependimento e batizando todos da Judéia e circunvizinhança. O texto em estudo (v.11) faz parte do discurso de João Batista. O que motivou este discurso onde o texto em questão está inserido? A resposta encontramos no versículo 7:

v.7a - “E, vendo ele muitos dos fariseus e dos saduceus, que vinham ao seu batismo, dizia-lhes...”

O motivo que levou João Batista a pronunciar tais palavras foi a presença dos fariseus e saduceus.
E qual foi o teor de sua mensagem? Foi, claramente, uma advertência sobre a necessidade de real arrependimento e as conseqüências do não arrependimento.

v.7b – “...Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira futura?
v.8 – “Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento
v.10 – “E também agora está posto o machado à raiz das árvores; toda a árvore, pois, que não produz bom fruto, é cortada e lançada no fogo

A árvore que não produz bom fruto (o fruto digno de arrependimento – v.8) é cortada e lançada no fogo (indiscutivelmente o fogo do juízo, para onde vão todos os que não se arrependem do seu pecado)

Em seguida, João Batista contrasta a natureza do seu batismo, com a natureza do batismo de Cristo e, contrasta a natureza do batismo para os arrependidos, com a natureza do batismo para os não arrependidos...

v.11 - E eu, em verdade, vos batizo com água, para o arrependimento; mas aquele que vem após mim é mais poderoso do que eu; cujas alparcas não sou digno de levar; ele vos batizará com o Espírito Santo, e com fogo.

João contrasta a natureza física de seu batismo (com água), com a natureza espiritual do batismo de Jesus (com o Espírito). E contrasta a natureza do batismo para os arrependidos (com o Espírito Santo) e a natureza do batismo para os não arrependidos (com fogo).

Cristo é quem batizará os arrependidos com o Espírito Santo e é, também, quem batizará os não arrependidos com fogo (fogo de juízo; de condenação).

Confirmando esta verdade temos o versículo seguinte...

v.12 - Em sua mão tem a pá, e limpará a sua eira, e recolherá no celeiro o seu trigo, e queimará a palha com fogo que nunca se apagará.

Cristo tem a pá em sua mão. Ele mesmo recolherá o seu trigo (os arrependidos) e, Ele mesmo queimará a palha (os não arrependidos) no fogo que nunca se apaga (fogo de tormento eterno – Ap 20:10-15).

Com isto, concluímos que há uma clara conexão no contexto imediato. Quando atribuímos o significado de 'juízo' ao 'fogo' no versículo 11, temos plena harmonia com os versículos 7, 8, 10 e 12.


Analisaremos agora segundo a lei dos textos paralelos.

2. Lei dos textos paralelos – Esta lei define que um texto deve ser interpretado com o auxílio de outros textos que tratam do mesmo assunto.

Pela lei do contexto chegamos a conclusão que o “fogo” trata-se do fogo do juízo, levando-se em conta que o discurso de João Batista foi uma advertência dada, principalmente, aos fariseus e saduceus. Vamos analisar esta questão verificando os textos paralelos deste episódio: Mc 1:4-8; Lc 3:2-3, 6-9, 16-17 e Jo 1:29-33.

Em Mc 1:4-8 temos:

v.4 – Apareceu João batizando no deserto, e pregando o batismo de arrependimento, para remissão dos pecados.
v.5 – E toda a província da Judéia e os de Jerusalém iam ter com ele; e todos eram batizados por ele no rio Jordão, confessando os seus pecados.
v.6 – E João andava vestido de pêlos de camelo, e com um cinto de couro em redor de seus lombos, e comia gafanhotos e mel silvestre.
v.7 – E pregava, dizendo: Após mim vem aquele que é mais forte do que eu, do qual não sou digno de, abaixando-me, desatar a correia das suas alparcas.
V.8 – Eu, em verdade, tenho-vos batizado com água; ele, porém, vos batizará com o Espírito Santo.

Notem que o evangelista Marcos não cita a presença dos fariseus e saduceus, nem tampouco traz a pregação de advertência descrita em Mateus 3:7-10,12. Marcos deu ênfase a mensagem pregada aos arrependidos, logo, apenas contrastou a natureza de seu batismo, com a natureza do batismo de Cristo:

V.8 – Eu, em verdade, tenho-vos batizado com água; ele, porém, vos batizará com o Espírito Santo.

Não citando os fariseus e saduceus, nem a mensagem de advertência, omitiu-se o “fogo”.

Em Lc 3:2-3,6-9,16-17 temos:

v.2 – Sendo Anás e Caifás sumos sacerdotes, veio no deserto a palavra de Deus a João, filho de Zacarias.
v.3 – E percorreu toda a terra ao redor do Jordão, pregando o batismo de arrependimento, para o perdão dos pecados;
v.6 - E toda a carne verá a salvação de Deus.
v.7 – Dizia, pois, João à multidão que saía para ser batizada por ele: Raça de víboras, quem vos ensinou a fugir da ira que está para vir?
v.8 – Produzi, pois, frutos dignos de arrependimento, e não comeceis a dizer em vós mesmos: Temos Abraão por pai; porque eu vos digo que até destas pedras pode Deus suscitar filhos a Abraão.
v.9 – E também já está posto o machado à raiz das árvores; toda a árvore, pois, que não dá bom fruto, corta-se e lança-se no fogo.
v.16 – Respondeu João a todos, dizendo: Eu, na verdade, batizo-vos com água, mas eis que vem aquele que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar a correia das alparcas; esse vos batizará com o Espírito Santo e com fogo.
v.17 – Ele tem a pá na sua mão; e limpará a sua eira, e ajuntará o trigo no seu celeiro, mas queimará a palha com fogo que nunca se apaga.

Notem que o evangelista Lucas, embora não tenha feito uma menção direta aos fariseus e saduceus, descreveu todo o rigoroso discurso de advertência de João Batista. Isso deixa claro que Lucas apresentou a mensagem de João direcionada aos arrependidos e aos não arrependidos. Mas podemos inferir pelo texto de Lucas que os fariseus estavam presentes, pois há uma exortação direcionada aos judeus lhes ensinando que não deveriam ser arrogantes por serem filhos de Abraão (v.8 - confiram ainda com Jo 8:33). Sendo assim ele descreve as palavras de João da seguinte forma:

v.16 – Respondeu João a todos, dizendo: Eu, na verdade, batizo-vos com água, mas eis que vem aquele que é mais poderoso do que eu, do qual não sou digno de desatar a correia das alparcas; esse vos batizará com o Espírito Santo e com fogo.

Lucas descreve a árvore que não produz bom fruto e é queimada no fogo; descreve a palha que é queimada no fogo que nunca se apaga e, portanto, descreveu a natureza do batismo para os não arrependidos (com fogo).

Em  Jo 1:29-33 temos:

v.29 – No dia seguinte João viu a Jesus, que vinha para ele, e disse: Eis o Cordeiro de Deus, que tira o pecado do mundo.
v.30 – Este é aquele do qual eu disse: Após mim vem um homem que é antes de mim, porque foi primeiro do que eu.
v.31 – E eu não o conhecia; mas, para que ele fosse manifestado a Israel, vim eu, por isso, batizando com água.
v.32 – E João testificou, dizendo: Eu vi o Espírito descer do céu como pomba, e repousar sobre ele.
v.33 – E  eu não o conhecia, mas o que me mandou a batizar com água, esse me disse: Sobre aquele que vires descer o Espírito, e sobre ele repousar, esse é o que batiza com o Espírito Santo.

O apóstolo e evangelista João, traz a descrição sobre o batismo de Jesus, para o dia seguinte do interrogatório de João Batista pelos fariseus (v.29). Analisando os quatro evangelhos (que não são contraditórios, mas sim complementares) percebemos que, num dia, João Batista vendo que os fariseus e saduceus vinham ao seu batismo, fez o discurso de advertência. Ainda neste dia João Batista foi interrogado pelos fariseus (Jo 1:19-28) e, no dia seguinte, Jesus veio para ser batizado. Nesta ocasião o Evangelho de João não menciona a presença dos fariseus e é onde encontramos a confirmação de João Batista:

v.33 – E  eu não o conhecia, mas o que me mandou a batizar com água, esse me disse: Sobre aquele que vires descer o Espírito, e sobre ele repousar, esse é o que batiza com o Espírito Santo.

Não havendo a presença dos fariseus e saduceus, não há advertências, nem, tampouco, “o batismo com fogo”.

Portanto, pela lei dos textos paralelos podemos concluir que “fogo” denota juízo e, por isso, está sempre associado a mensagem de advertência pela presença dos fariseus e saduceus (que foram, também, duramente advertidos por Jesus, por serem hipocritas).


Agora vamos fazer uma breve análise segundo o princípio hermenêutico do “autor como elemento determinante do significado”

3. Lei do autor – Deve-se, sempre que possível, comparar outros escritos do mesmo autor em estudo. Os autores bíblicos escreveram seus livros em épocas diferentes, em lugares diferentes, sob circunstâncias diferentes... comparar os escritos de autores que viveram em épocas semelhantes, também pode ajudar na interpretação do texto.

Segundo este princípio, faremos uma comparação dos escritos de Lucas que tratam deste assunto.

Com já vimos anteriormente, no Evangelho segundo Lucas encontramos a pregação de advertência de João Batista e, conseqüentemente, a distinção dos “batismos” (com o Espírito Santo e com fogo). Se analisarmos o livro dos Atos dos Apóstolos, também de autoria de Lucas, encontraremos no capítulo 1 a promessa do batismo por Jesus. E assim foi descrita:

“Porque, na verdade, João batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo, não muito depois destes dias” (At 1:5)

Aqui cabe a pergunta: Por que o evangelista Lucas disse em seu evangelho que seriam “batizados com o Espírito Santo e com fogo, mas em Atos disse “sereis batizados com o Espírito Santo” somente?

A resposta, mais uma vez, gira em torno da questão: “quem eram os seus ouvintes?”

No Evangelho, Lucas menciona que João Batista se dirigiu à multidão que vinha se batizar e sabemos pelos textos paralelos que seu discurso foi motivado pela presença dos fariseus e saduceus em meio à multidão. Já no livro de Atos, o discurso foi dirigido aos fiéis discípulos de Jesus que o viram ressurreto. Estas ocorrências, mais uma vez, apontam para a aplicação de “juízo” à palavra “fogo”. Quando a mensagem foi dirigida aos arrependidos e não arrependidos, a afirmação foi “sereis batizados com o Espírito Santo e com fogo”; quando a mensagem dirigia-se somente aos arrependidos, a afirmação foi “sereis batizados com o Espírito Santo”.

Além deste texto temos ainda as palavras do apóstolo Pedro descritas em At 11:16, quando ele dava testemunho sobre o batismo do Espírito Santo também sobre os gentios:

v.16 - E lembrei-me do dito do Senhor, quando disse: João certamente batizou com água, mas vós sereis batizados com o Espírito Santo.

Mais uma vez,  quando a mensagem é dirigida aos discípulos fiéis o "fogo" é omitido.

E lembrei-me do dito do Senhor, quando disse: João certamente batizou com água; mas vós sereis batizados com o Espírito Santo
Atos 11:16
E lembrei-me do dito do Senhor, quando disse: João certamente batizou com água; mas vós sereis batizados com o Espírito Santo
Atos 11:16
E lembrei-me do dito do Senhor, quando disse: João certamente batizou com água; mas vós sereis batizados com o Espírito Santo
Atos 11:16

Conclusão
Tanto o contexto, quanto os textos paralelos e a análise do autor como determinante do significado, remetem ao “fogo do juízo” (o fogo que nunca se apaga) o significado do termo “fogo” em Mt 3:11. Jesus é quem batiza com o Espírito Santo e também quem batizará no fogo do juízo.


3 de abril de 2011

1Jo 1:8 - O pecado e o perdão

“Se dissermos que não temos pecado, enganamo-nos a nós mesmos, e não há verdade em nós”


A existência do pecado é uma realidade, ainda que muitos discordem disso nos dias de hoje. “Pecado” é uma tradução do grego “amartia” e em seu sentido literal quer dizer: “errar o alvo”.

A humanidade foi criada a imagem e semelhança de Deus e deveríamos espelhar o Seu caráter. Sempre que agimos, falamos ou pensamos fora dos padrões estabelecidos pelo caráter Santo de Deus, pecamos, pois erramos o alvo do propósito de Deus para nós em nossa criação. E o salário do pecado é a morte!

Mas Deus estabeleceu uma maneira para que pudéssemos nos livrar da culpa pelo pecado. Ele providenciou que outro morresse em nosso lugar. E para obter o perdão de nossos pecados só precisamos crer naquele que o Pai providenciou: Seu Filho Jesus Cristo – O Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo.

Pelo Seu amor inexplicável Deus nos proporcionou de graça a nossa salvação. Mas em nossa soberba acreditamos que podemos fazer algo que possa nos garantir o mérito da nossa redenção. Este engano nos afasta da maravilhosa dádiva do amor de Deus: “Porque pela graça sois salvos, por meio da fé; e isto não vem de vós, é dom de Deus. Não vem das obras, para que ninguém se glorie” (Efésios 2:8-9).

Só Jesus tem o poder de nos purificar do pecado. Portanto "se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados, e nos purificar de toda a injustiça” (1Jo 1:9). O perdão não depende daquilo que eu faço, mas daquilo que Jesus fez por mim, “em quem temos a redenção pelo seu sangue, a remissão das ofensas, segundo as riquezas da sua graça” (Efésios 1:7)

9 de fevereiro de 2011

Livre-arbítrio - Uma resposta a meu amigo

Uma resposta a meu irmão em Cristo Juvenil Lino do blog Reflexões Bíblicas sobre a questão do livre-arbítrio. Com base em seu texto “Deus nos deu o livre-arbítrio?


Falar sobre a liberdade humana e a soberania de Deus é um assunto extremamente complicado e que suscita uma série de questões. Eu confesso que sou muito pequeno para trazer uma resposta contundente sobre o assunto, até mesmo porque, eu nem consigo entender muito do que leio a respeito. Eu reconheço minhas limitações. Mesmo assim, eu gostaria de apresentar meu ponto de vista sobre esta questão, mais precisamente, minha resposta ao seu ponto de vista.

Discussões sobre o Livre-arbítrio

Reflexões e discussões sobre a liberdade do homem (ou a ausência dela) existem desde a muito tempo na igreja cristã. Essa não é uma ideia que vem do arminianismo, como você declarou. Segundo Alister E. McGrath em Teologia sistemática, histórica e filosófica - Shedd Publicações – 2005 – o termo livre-arbítrio foi introduzido na igreja ocidental pelo teólogo Tertuliano no século II e foi trabalhado por Agostinho que nasceu no século IV, muito antes, portanto, de Armínio que nasceu no século XVI. Mas filósofos já deliberavam sobre este assunto muito antes de Cristo nascer. O próprio Tertuliano usou este termo emprestando-o do estoicismo que surgiu no século III a.C.

Este é um tema traz profundas implicações sobre vários aspectos da nossa vida. A noção de livre-arbítrio incidi, por exemplo, diretamente na questão da responsabilidade moral de nossos atos. Já na conclusão de seu tratado, usando de retórica, você faz as seguintes perguntas:

”Tem-se liberdade por que prestar contas?

Se Deus me deu livre-arbítrio por que tenho que dar contas de meus atos?

E que moral Deus tem de me cobrar os atos de uma liberdade que ele me [deu]?”

Mas perceba que a liberdade e a responsabilidade não são excludentes.

Deixe-me ser extremista para esclarecer meu ponto de vista:

Imagine que um homem possua um robô de controle remoto. Imagine que este homem coloque nas mãos deste robô uma arma e controlando-o a distância, dispare e mate outro homem. Diante deste cenário eu pergunto: qual foi a responsabilidade moral do robô neste homicídio? Nenhuma! Ele não possui volição, nem capacidade de julgamento e suas ações foram totalmente determinadas pelo homem que o controlava.

Num caso de ausência total de liberdade seríamos como este robô. Não seríamos agentes livres e a responsabilidade de nossas ações seria inteiramente da causa determinante (na alegoria, do homem com o controle remoto). Portanto, se não há opções de escolha e se a ação independe da minha vontade, como posso ser responsabilizado moralmente por qualquer coisa? É justamente por termos liberdade que podemos ser responsabilizados por nossos atos.

Buscando uma definição

Não é simples definirmos o que significa “livre-arbítrio”, porque devemos levar em consideração que há mais de uma interpretação a cerca do que deve ser considerado uma pessoa realmente “livre”.

De modo geral e simplista, “livre-arbítrio” é popularmente definido como ”o direito de escolha” ou “liberdade para escolher”, entendendo-se por isso ser a liberdade que cada pessoa tem para julgar e decidir que ação tomar diante de determinada situação. É com este sentido que a grande maioria das pessoas, cristãs ou não, empregam esta expressão.

No campo da filosofia há uma infinidade de conceitos. Dentro da teologia eu quero destacar duas interpretações para o livre-arbítrio:

Livre-arbítrio libertário – Casa-se bem com a definição que você apresentou:
”É a liberdade que o homem tem de tomar decisões sem constrangimento e a crença de que o comportamento humano é autônomo"
Define-se como a possibilidade de alguém poder fazer mais de uma escolha em determinada circunstância, isto é, diante de uma situação “X” eu posso escolher entre a ação “A” ou “B”, ou ainda, entre “A” e “não A”. Perceba que se eu tiver a opção de agir ou não agir, isso também me dá mais de uma opção de escolha.

Dentro desta definição, qualquer circunstância que nos deixasse com apenas uma escolha, sendo impossível escolher outra coisa, isso anularia nosso livre-arbítrio.

Livre-arbítirio compatibilista ou determinismo suave – Define-se como a possibilidade de alguém tomar uma decisão voluntária; é a possibilidade de alguém fazer o que deseja desde que esta decisão não seja, nem fisicamente forçada, nem psicologicamente coagida.

Embora as diferentes definições pareçam ser iguais na prática, há, na verdade, uma profunda diferença. Os compatibilistas admitem, por exemplo, que se uma pessoa possuir um caráter formado e “solidificado” de uma maneira tal que em determinada situação ela venha a tomar uma decisão que seja inevitável, por causa da formação do seu caráter, essa decisão ainda assim, foi livre e moralmente significativa. Os libertários não admitem essa possibilidade. Se a decisão foi “inevitável”, logo não havia outras opções de escolha e isso equivaleria dizer que esta decisão não foi moralmente significativa e, portanto, não foi totalmente livre.

É claro que para o desenvolvimento de cada um destes pensamentos há muito mais o que ser dito, pois cada posionamento gera suas respectivas implicações e questionamentos e seus defensores “lutam” para explicá-las adequadamente. Eu, como já disse, sou muito pequeno para entrar em uma discussão tão complexa e creio que, para o que me proponho nesta resposta, o que apresentei já é suficiente.

Analisando sua argumentação

Perceba que seja qual for a definição que se assuma por "livre-arbítrio" dentre as apresentadas, a imposição de regras, leis ou mandamentos, não anula o livre-arbítrio, uma vez que obedecer ou não já constitui uma questão de escolha e depende da vontade de cada um.

Portanto, o fato de Deus ter ordenado não comer da árvore do conhecimento, não anula o livre-arbítrio de Adão de optar por obedecer ou não, nem tampouco a liberdade de Eva de apreciar o fruto, julgá-lo agradável e voluntariamente comer o que lhe era desejável. Assim, considerar o livre-arbítrio do homem inexistente, por haver Deus estabelecido que cumpramos a Sua vontade é uma falha de conceito, já que a própria rebeldia já consiste em uma questão de escolha vonluntária.

Da mesma forma, quando Deus apresenta, diante do povo de Israel, as consequências que suas ações trariam (a bênção ou a maldição (Dt 11:26-28)), isso não limitou o livre-arbítrio de cada um, ainda que Deus tenha exigido obediência, pois segundo o que você mesmo declarou...
”[A ação], de acordo com essa teoria do livre-arbítrio, é uma escolha livre, mesmo quando o indivíduo sabe que a ação escolhida pode trazer consequencias graves”
Apresentando como exemplo a analogia “a porta estreita e a porta larga (Mt 7:13)” você usou como argumento de que a imposição de condições essenciais para herdarmos os céus quebra qualquer impetração de liberdade. Mas ao contrário do que você declarou em seu texto, livre-arbítrio não nos remete a “facilidades”, e sim a “vontade”, assim sendo, viver em renuncia, em dedicação, em santificação, não se trata da exclusão do livre-arbítrio, mas do exercício que fazemos dele, já que a responsabilidade é toda minha se, me desviando da porta estreita, eu entrar pela porta larga.

Outro problema que a sua argumentação levanta é o fato de tratar do livre-arbítrio por um viés puramente moral. Mas toda nossa vida é regida por uma infinidade de questões de ordem puramente natural. Pense, por exemplo, em todas as decisões que precisamos tomar do momento em que levantamos até a hora de irmos trabalhar... Em que momento levantar; quando tomar banho; lavar ou não o cabelo; como pentear o cabelo; com gel? Sem gel? Penteado? Arrepiado? Que tipo de roupa usar; qual cor de roupa usar; preta? Vermelha? Tomar ou não café-da-manhã; o que tomar no café-da-manhã... Quase que ininterruptamente precisamos tomar decisões e fazer escolhas. Em quais destas situações somos privados de livre-arbítrio? – Pergunto sob a ótica do objetivo do seu tratado de desautorizar a ideia de que Deus nos deu o livre arbítrio.

A soberania de Deus e a liberdade do homem

Neste momento quero deixar claro que, embora defenda o livre-arbítrio do homem, de forma alguma nego a soberania de Deus. Deus é soberano e pode interferir sim no livre-arbítrio do homem quando bem entender para cumprir os seus propósitos. Mas não acredito que Ele faça isso privando o homem de toda a sua liberdade – isso seria o mesmo que dizer que Deus é responsável pelo pecado (como apresentei na alegoria do robô).

Mesmo no caso de Faraó em que Deus claramente declara que endureceria seu coração, não consigo enxergar que seu livre-arbítrio tenha sido totalmente suprimido, pois do mesmo modo que as Escrituras declaram que Deus endureceu o coração de Faraó (Ex 4:21; 7:3; 9:12; 10:1,20,27; 11:10; 14:4,8), também declara que Faraó, por sua própria determinação, impediu que o povo saísse (Ex 3:19; 7:13,22; 8:15,19,32; 9:7,34-35; 13:15). Isso mostra não só a soberania de Deus determinando os atos para cumprirem o Seu propósito, como também a liberdade do homem atuando conforme a obstinação de seu próprio coração. Esta é uma situação de ocorrência duplamente causada. É a isso que os compatibilistas chamam de doutrina da “concorrência”, quando um mesmo evento é, ao mesmo tempo, plenamente (cem por cento) causado por Deus e plenamente (cem por cento) causado pela criatura que o realiza. Lembre-se que segundo o conceito compatibilista de liberdade, ainda que Deus tenha determinado uma situação, a ação humana será livre, desde que feita voluntariamente e sem coerção.

Aqui, faço uso das suas palavras:
“Deus se utiliza do livre-arbítrio do homem sem destruí-lo, apesar de não sabermos exprimir de que maneira Ele o faz”

(Neste trecho de seu tratado – “O livre arbítrio e o determinismo” – eu fiquei realmente muito confuso, pois você defendeu o livre-arbítrio do homem ao invés de desautorizá-lo)

Não podemos elevar a soberania de Deus a tal ponto em que a liberdade do homem e a sua responsabilidade sejam eliminadas, nem tampouco exaltar a liberdade do homem a ponto de eliminar a soberania de Deus.

Neste conflito entre o livre-arbítrio (liberdade do homem) e a soberania de Deus (liberdade de Deus) não há como não relegarmos nossa reflexão ao vasto mundo dos Mistérios de Deus.

“As coisas encobertas pertencem ao SENHOR nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem a nós e a nossos filhos para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei” (Dt 29:29)

Fomos criados a imagem e semelhança de Deus

Deus nos criou a Sua imagem e semelhança para que pudéssemos ter comunhão com Ele. O Senhor não criou “deuses” na terra, mas criou seres que podiam refletir, de certo modo e em certo grau, a Sua moral, o Seu intelecto, a Sua volição. Este padrão estabelecido por Deus na criação, inevitavelmente, concede aos homens livre-arbítrio, já que nos foi dado capacidade de julgar o que é bom (pesar as consequências dos nossos atos) e de optar pelo que nos é desejável – ainda que esta escolha implique em desobedecer as ordens de Deus.

A responsabilidade da ação humana (inexistente sem liberdade) não se trata de um conceito arminiano, ou calvinista, ou exclusivo de qualquer corrente teológica, mas é uma verdade bíblica aceita e defendida por qualquer cristão sincero.

Sei que sou leigo no assunto, mas acredito que a maior parte das discussões sobre o livre-arbítrio não é um debate sobre a existência da liberdade em si, mas da amplitude dessa liberdade e sua relação com a soberania de Deus. Até mesmo porque, a "Confissão de fé de Westminster" (reformada e calvinista) também confirma a liberdade e a responsabilidade dos homens:

"Deus, desde toda a eternidade, por meio do seu mais sábio e santo conselho, de sua própria vontade, livre e imutavelmente, ordenou o que quer que seja que aconteça; contudo, por meio disso, Deus não é o autor do pecado; nem isso é uma violência à vontade das criaturas, nem é a liberdade ou a contingência de segundas causas suprimida, mas, em vez disso, estabelecida" (grifo meu)

Contradições

Eu entendi qual foi o objetivo do seu estudo, mas seu posicionamento está muito confuso. Ora você nega completamente a existência de livre-arbítrio, ora você o defende. Num momento você aplica um conceito para “livre-arbítrio”, noutro transmite uma ideia totalmente diferente.

Você inicia seu tratado definindo o livre-arbítrio como a liberdade que o homem tem de tomar decisões sem constrangimento, mas conclui atribuindo a esta liberdade o mesmo significado de “libertinagem”:
“Deus não deu o livre-arbítrio ao homem, essa pseudo-liberdade foi uma herança (...) de Adão e seremos julgados por essa orgulhosa liberdade (libertinagem)”

É bom lembrarmos que o que herdamos de Adão não foi a liberdade, mas a natureza pecaminosa

Isso se torna mais problemático quando lemos que sua...
“...intenção é sem dúvida desequilibrar a posição dos arminianos leigos que sempre declaram que DEUS deu livre-arbítrio ao homem”
Isso nos leva a crer que você esteja atribuindo aos arminianos uma "defesa da legalidade de vivermos dissolutamente". Mas não acredito que arminianos, ou pentecostais, ou qualquer outro grupo genuinamente cristão defendam a libertinagem. Tenho certeza que você também não acredita. Qualquer arminiano poderia defender-se dizendo que a libertinagem é o resultado do uso irresponsável do livre-arbítrio e não o próprio livre-arbítrio.

Você criticou os arminianos por defenderem o livre-arbítrio, mas sua argumentação não confrontou o entendimento arminiano de liberdade. Na verdade você apresentou uma definição de livre-arbítrio (que se encaixa com o pensamento arminiano), mas desenvolveu o tema atribuindo um outro sentido ao termo – e ainda assim insistiu que esta era a visão arminiana.

Dentro da argumentação que você fez, podemos encontrar, ainda, uma contradição lógica.

Levando-se em consideração toda a argumentação que você apresentou nos tópicos “Exegese Bíblica” e “Conclusão”, podemos entender que, segundo o seu entendimento, a imposição de condições ou a existência de mandamentos e leis anulam nosso livre-arbítrio e, por não haver livre-arbítrio seremos julgados por nossos atos. Bem, com este entendimento de liberdade e responsabilidade humanas, analisemos as seguintes declarações:
  1. Deus não deu o livre-arbítrio ao homem, essa pseudo-liberdade foi uma herança (...) de Adão e seremos julgados por essa orgulhosa liberdade (libertinagem)
  2. Somos servos de Deus e não gozamos da liberdade de fazer aquilo que é pecado...
  3. A “imposição de condições” quebra qualquer impetração de liberdade...
  4. Este estudo é uma desautorização do livre-arbítrio do Cristão, só o homem separado de Deus o tem
  5. ...escravo ou servo, [são] pessoas que vivem abdicando dos direitos de liberdade. Nós Cristãos (...) negamos a libertinagem e (...) renunciamos esse maldito livre-abítrio...
Contradição 1
  • Se o homem separado de Deus tem esse livre-arbítrio (4), então...

  • Ele goza de liberdade para fazer aquilo que é pecado (2), pois...

  • Para o homem separado de Deus que tem livre-arbítrio não há qualquer imposição de condições (3), logo...

  • Os homens separados de Deus não serão julgados, pois só os cristãos que não possuem livre-arbítrio serão julgados (1) Afinal de contas...

  • Tem-se liberdade por que prestar contas?


  • Contradição 2

  • Se Deus não deu livre-arbítrio ao homem (1) e só o homem separado de Deus o tem (4), então...

  • Adão e Eva foram os únicos a serem privados de livre-arbítrio, já que depois da queda todos estavam separados de Deus. Isto posto, podemos crer que Jesus morreu para redimir somente a Adão e Eva, já que todos os demais têm o livre-arbítrio (4) e gozam da liberdade para fazer aquilo que é pecado (2), não carecendo, portanto, de salvação.


  • Perceba que o conceito de livre-arbítrio não pode diferente para cristãos e não cristãos. A mesma liberdade concedida a um, deve necessariamente ser concedida ao outro. O que vai mudar são as consequências geradas pelas ações dentro desta liberdade.

    Contradição 3
  • Se servos são pessoas que vivem abdicando dos seus direitos de liberdade (5), então...

  • Não é possível negar que estes servos possuam liberdade, pois não se abdica de um direito que não se possui.

  • Se o cristão não possui livre-arbítrio (4), então...

  • Não há o que se renunciar (5), mas se renunciamos esse maldito livre-arbítrio (5), então...

  • Não podemos negar que o possuímos, pois não é possível renunciarmos de algo que não temos.


  • Estes pontos tornam confusa a sua interpretação de livre-arbítrio.

    Entendi também que sua argumentação sobre o livre-arbítrio incide mais na questão da “legalidade” (o que devemos fazer), do que na questão da “possibilidade” (o que temos a capacidade de fazer) e de acordo com este raciocínio, nenhum cristão sincero discordaria de você. Algum cristão sincero discordaria que todos nós estamos sujeitos a pecar (temos a capacidade), mas que de modo nenhum devamos pecar?

    Certo é que nenhum cristão verdadeiro defenderia a existência do livre-arbítrio como justificativa para permanecer no pecado.

    A vida que vivemos, vivemos na fé do Filho de Deus e aguardamos ansiosos pelo dia que seremos livres até da vontade de pecar, mas até que este dia chegue, infelizmente, teremos que encarar a verdade de que o pecado é uma realidade em nossas vidas, mais frequente do que gostaríamos que fosse.

    Nós oramos sim ao Pai, pedindo que a Sua vontade seja feita, mas porque sabemos que por causa da nossa atual condição carnal, não corresponderemos a santidade de Deus se fizermos a nossa própria vontade.

    Mas infelizmente não somos impedidos de pecar... melhor seria se fôssemos!

    Este assunto é importante, profundo e levanta muitas questões. Por isso, eu, com toda a humildade, sugiro a você que analise seus argumentos e reveja a apresentação de seu tratado, afim de explicá-lo com maior clareza. Sei que sua intenção não foi levantar polêmica pela polêmica, mas para trazer edificação pela luz do evangelho de Cristo.

    Fiquei a vontade para lhe escrever esta resposta porque sei que você, não só, esperava por críticas e mais críticas, mas também porque sabe o quanto o admiro e o amo em Cristo Jesus. Esta resposta não é, portanto, fruto de afronta mesquinha, mas de pura divergência de opiniões.

    Certamente estudos como este nos fazem refletir a cerca de nossa situação no Reino de Deus e nos levam a confrontar velhas certezas. Isto nos enriquece e muito!

    Fica na Paz do Senhor, amado!

    Seu irmão em Cristo

    Dovaniano
    Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...